A Revolta de 3 de Fevereiro de 1927
Durante quase uma década, setores políticos democráticos e radicais atrasaram o estabelecimento de um regime fascista, impondo-se aos ditadores militares pela força das armas e pelas mobilizações populares de rua.
Em mais de 10 revoltas ou simples intentonas falhadas – com relevo para a “Revolta de 3 de Fevereiro de 1927” e para as revoltas de 1931 – estes setores radicais mantiveram acesa uma guerra civil larvar e intermitente que veio a ser conhecida como o “Reviralho”.
Sobre o Reviralho
O termo “Reviralho” manteve durante muito tempo, uma conotação depreciativa, tanto por parte dos situacionistas como por parte dos setores políticos situados mais à esquerda, particularmente dos comunistas. Os primeiros acusavam o “bando” de pretender realojar os “políticos”, ávidos por reaver “as rendosas posições perdidas”, com o apoio de “bolchevistas” e de “aventureiros e bombistas”; os segundos, desvalorizavam a ação dos “revoltosos” a quem acusavam da promoção de sucessivos golpes falhados e de uma ação revolucionária inconsequente. A historiografia atual, na base de uma visão mais ampla da história das oposições ao regime fascista, revalorizou a resistência republicana radical e socialista que, entre 1926 e 1940, se opôs pela firmeza da luta armada à implantação da “Ditadura Nacional” e do Estado Novo.
O bloco anti ditatorial reunia a esquerda republicana (civil e militar), a intelectualidade seareira, um escol de antigos líderes republicanos (ex-ministros, deputados, governadores e um Presidente da República), o mundo estudantil e muitos liberais, comunistas e anarquistas desagregados.
Unia-os um programa mínimo que incluía a formação de um Governo Provisório, composto por «homens competentes», a demissão dos ditadores e a reposição das liberdades públicas e do Estado Constitucional.
Dois anos depois da “Revolta 3 de Fevereiro de 1927”, já no exílio parisiense, Jaime Cortesão – um dos ideólogos da Resistência Republicana – afirma que “…nem por um momento se arrepend[eu] de [se] ter revoltado, em Fevereiro de 1927, contra a tirania caserneira que impera[va] em Portugal”. Porém, a sua revolta não pugnava pela recuperação de um passado de que não se orgulhava, mas antes pela construção de um outro futuro: “O meu ideal em política nacional não é o regresso ao statu quo ante. Não há democracia quando os partidos políticos colocam os seus interesses de grupo acima do ideal comum que devia animá-los, quando se tornam fações, divididos por ódios e não por ideias. Aspiro a uma democracia portuguesa em que os partidos saibam antes de mais cooperar para o ideal comum de alcançar pela reforma interna – educativa e económica, na metrópole e nas colónias, a plena soberania nacional (…)”.
A “Revolução da Semana Sangrenta”
O primeiro grande afrontamento entre a resistência republicana e a Ditadura Militar (e o único que verdadeiramente fez tremer a situação), ocorreu no Porto, de 3 a 7 de Fevereiro de 1927 – a “Semana Sangrenta”.
O Comité Revolucionário era chefiado pelo general Sousa Dias e integrava ainda ocoronel Fernando Freiria, o tenente-coronel Pinto da Fonseca, o comandante Jaime de Morais, o capitão-médico Jaime Cortesão, o capitão João Pereira de Carvalho e o capitão Sarmento Pimentel.
Durante cinco dias, a guerra civil instala-se na Praça da Batalha, coração do Porto. Os revolucionários de Caçadores 9 contaram com outras unidades militares da cidade, de Penafiel, Valença, Vila Real, Lamego e Chaves, bem como da GNR, tendo-se apoderado do Quartel-General, do Governo Civil e dos Correios e Telégrafos. Ao mesmo tempo eram presos o Governador Civil do Porto, o presidente da comissão local de censura, os 1º e 2º comandantes da Região Militar e os ministros do Comércio e da Instrução, para além de outros oficiais.
Para combater a revolta foi designado o próprio ministro da Guerra, coronel Passos e Sousa, que concentrou a partir de Aveiro as forças fiéis à ditadura (ver fotografia), seguindo depois para o Porto, dirigindo as forças de Artilharia 5 da Serra do Pilar, às quais se juntaram reforços militares da Covilhã e Braga e um contingente de 1200 homens idos de Lisboa, desembarcado em Leixões, sob o comando do general Farinha Leitão.
Aos militares revoltados juntaram-se algumas centenas de civis – funcionários públicos, estudantes, jornalistas e homens de letras, operários e elementos de profissões liberais – sob a coordenação de José Domingues dos Santos (ver fotografia), líder da Esquerda Democrática - com os revoltosos procurando entricheirar-se em diversos locais da cidade (ver fotografia).
Calcula-se que no Porto estiveram frente a frente cerca de 2500 resistentes constitucionais e cerca de 4000 efetivos governamentais, com recurso a toda a sorte de armas ligeiras e pesadas, incluindo bombardeamentos aéreos e da marinha.
Textos da autoria de Luís Farinha