Nascido a 18 de Abril de 1937, em Susana (São Domingos), alfaiate, foi preso em Julho de 1962, quando se encontrava numa festa de batismo:
“A casa foi invadida por soldados. Eu e um outro colega fomos levados para o quartel.” Interrogado por um sargento que exibia um chicote sobre os seus contactos com os “terroristas”. Negou que os tivesse. O sargento chamou então um soldado para o chicotear:
“Primeiro mandou-me tirar a camisa e o calção, fiquei só em cuecas. O rapaz começou a bater-me, a bater-me, até dez vezes.” Como continuasse a negar ter contactos com “terroristas”, “mandou bater-me novamente, 15 vezes, até eu cair.”
Foi depois levado para uma sala onde estavam outros presos, enquanto o colega era espancado: “Sofremos todos o mesmo açoite. Depois amarraram-nos, mãos e pés, e ficámos sentados no chão.”(…) Ali ficámos três dias sem comer, davam-nos apenas água para beber.”
Foram depois levados para a cadeia de São Domingos, onde as famílias lhes levaram comida. Ao fim de uma semana foram levados para Bula, onde passaram mais um mês na cadeia, deitados no chão. Já em Setembro foram levados para João Landim e depois de barco para o Presídio da Ilha das Galinhas, onde só estiveram um dia, partindo depois no navio “África Ocidental” para Cabo Verde, sendo depois levados em botes para terra e conduzidos em carros para a campo de concentração do Tarrafal. Ali ficou até 1964, altura em que foi reenviado para a Guiné, onde foi declarado “livre, mas com vigilância”, devendo apresentar a guia onde isso vinha escrito sempre que se deslocava.
Do Tarrafal guarda uma memória forte: “Comigo no Tarrafal aconteceu uma coisa muito estranha que eu vi. Quando alguém fazia uma coisa que não era do agrado dos responsáveis do campo, eles levavam essa pessoa a um sítio – eu fui levado para lá, onde fiquei três dias. Mandaram-me sentar e uma gota de água começou a pingar-me na cabeça. Bastavam cerca de 15 minutos, quando a pessoa saía de lá ficava como se tivesse carregado o mundo na cabeça.”
Texto e fotografia a partir de "Tarrafal-Chão Bom, Memórias e verdades", de José Vicente Lopes, a quem agradecemos.