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Operação Amílcar Cabral

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O assassinato de Amílcar Cabral em Conacri provocou, naturalmente, grande impacto na direção do PAIGC, nos combatentes e populações da Guiné-Bissau, nos dirigentes da República da Guiné e um pouco por todo o mundo. Face a tal tragédia, não foi fácil recobrar a confiança e determinação suscetíveis de ultrapassar a enorme perda sofrida.

Passados dezoito dias sobre o crime, reuniram-se, de 7 a 9 de fevereiro de 1973, os membros do CEL (Conselho Executivo da Luta) e do CSL (Conselho Superior da Luta) do PAIGC presentes em Conacri, adotando várias decisões políticas, operacionais e internacionais que se revelaram essenciais para o prosseguimento da luta. E, designadamente, decidiram “Convocar o Conselho de Guerra, cuja ação deve conduzir à intensificação da luta armada em todas as frentes, nesta fase decisiva da nossa luta.” Essas decisões contrariaram as esperanças dos colonialistas, que viam no assassinato de Cabral o “princípio do fim” dos combates pela independência da Guiné-Bissau. E, diga-se em abono da verdade, mesmo alguns países e instituições amigas manifestaram hesitações similares.

O PAIGC vai iniciar a operação Amílcar Cabral (que, por vezes, aparece também designada pelo seu principal pseudónimo, Abel Djassi), operação político-militar que terá os seus momentos culminantes na tomada de Guilegje e na proclamação unilateral da independência da Guiné-Bissau, em Madina do Boé, a 24 de setembro de 1973.

Em todo o território nacional, as forças do PAIGC passaram ao ataque, evidenciando novas capacidades morais e técnicas e uma clara orientação estratégica, concentrando os seus esforços principais nos corredores de Guidage, a Norte, e de Guiledje, a Sul - tornando especialmente difícil a manobra das forças militares portuguesas, com muitos aquartelamentos cercados, duramente atingidos pela artilharia e pelos assaltos e emboscadas que imobilizavam as tropas coloniais.

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Entretanto, com Cabral ainda em vida, conseguira obter o fornecimento pela União Soviética de mísseis superfície-ar portáteis "Strela 2", capazes de abater meios aéreos, com recurso a sistemas de deteção por infravermelhos - o que permitiria aniquilar a supremacia aérea do exército colonial.

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Guiledje constituia uma posição de assinalável importância estratégica, no cruzamento da estrada que percorre a fronteira sul com a República da Guiné e a estrada de Bedanda. Acrescia que estava situado relativamente perto do "Caminho di Povo" (ou "caminho da morte", na versão portuguesa) que acedia à base do PAIGC de Kandiafara, na região de Boké. Acrescia que, no seu interior, tinha sido instalada uma "aldeia estratégica", para onde as populações tinham diso levadas, o que colocava problemas ao seu bombardeamento.
Amílcar Cabral tinha preparado longamente o ataque a esse quartel português mas a sua concretização final só teve lugar em maio de 1973, quatro meses após a sua morte.

O ataque ao quartel de Guiledje durou três dias e quatro noites, com intenso bombardeamento de artilharia pesada. Começou no dia 18 de maio de 1973 e só terminou a 22 do mesmo mês. O comandante desse aquartelamento, Coutinho e Lima, pediu insistentemente apoio a Bissau, sem nunca o conseguir em tempo. Face à incapacidade de resistir, ordenou o abandono do quartel de Guiledje, o que foi conseguido através de um trilho de caça que as populações conheciam - o que não impediu que viesse a ser preso às ordens de Spínola, até depois de 25 de abril de 1974.

Entretanto, Bissau enviaria apoio aéreo, que, no entanto, conheceu, pela primeira vez, a nova realidade dos mísseis "Strela 2": entre 25 de Março e 1 de Junho foram atingidos dois Fiats G-91, um T-6 e um DO-27, para além de terem sido flagelados helicópteros e outras aeronaves.

Como referiu Pedro Pires, "com a entrada em ação no campo militar desses foguetes Strela criámos as condições para que a operação Guiledje fosse um sucesso", com assinalável "efeito desmoralizador" no seio das forças armadas portuguesas. "A tomada de Guiledje foi importante pela sua posição estratégica. Ficou aberto o caminho para a entrada das nossas forças, dos nossos meios mecânicos, no sul da Guiné."

Nesses tempos finais da guerra, as tropas coloniais somavam 35 465 efectivos na Guiné-Bissau, cuja população não ultrapassava os 750 mil habitantes. E, no entanto, era evidente que a guerra estava irremediavelmente perdida.

Como assinalou o cor. Fernando Policarpo no seu livro "Guerra da Guiné", Quidnovi, 2006
"era previsível o colapso do exército português num período relativamente curto"

Na verdade, a partir daí acumulam-se as derrotas políticas e militares dos colonialistas, quer no terreno da Guiné, quer no campo internacional, quer também no campo português, onde são militares que, cansados da guerra colonial, preparam a operação "Fim de regime", que eliminará uma ditadura com mais de 48 anos e que, nomeadamente, virá a reconhecer a independência da Guiné e de Cabo Verde.